Entrevista com Silvia Zwi, diretora de Recursos Humanos na Eaton para América do Sul e Central.
Por Pedro Cunha
“Quando a Eaton converte alunos do Formare para os quadros operacionais, eles já estão treinados, aculturados, conscientes e engajados com os nossos princípios de gestão. Este é um importante ganho para a Eaton.”
Líder mundial no fornecimento de componentes e sistemas elétricos, hidráulicos, automotivos, aeronáuticos e de filtração, a Eaton se destaca pela excelência na entrega de soluções aos seus clientes. Há mais de quatro anos no cargo de diretora de Recursos Humanos na Eaton para América do Sul e Central, Silvia Zwi valoriza os seis objetivos de aspiração que estão vinculados à Visão da empresa. Dentre eles, está o fortalecimento das comunidades onde opera, sendo o Formare o maior e mais longevo programa de responsabilidade social empreendido pela Eaton no Brasil.
Formare: A Eaton se instalou no Brasil há 62 anos, em São José dos Campos, Estado de São Paulo. Exatamente nesta unidade pioneira, a empresa inaugurou sua primeira turma do programa Formare, 11 anos atrás. Esta coincidência tem alguma relação com a estratégia da empresa no País?
Silvia Zwi: A Eaton, dentro da sua declaração de visão organizacional, tem seis objetivos de aspiração. Queremos ser o fornecedor preferido, ser um excelente local para se trabalhar, zelar pela segurança e saúde dos nossos funcionários e dar o suporte necessário às comunidades onde operamos. O Formare tem impacto direto no objetivo voltado às comunidades. Ao fazermos a seleção dos 20 jovens que participam do Formare em cada uma das nossas plantas, ano após ano, focamos nas populações menos privilegiadas. Fazemos inclusive visitas às famílias dos inscritos para entender quais são aquelas que mais se beneficiarão dessa iniciativa. Quando a Fundação Iochpe nos traz uma pesquisa mostrando que, dentre outros ganhos, um aluno do Formare chega a ter dez vezes mais chance de entrar em uma universidade do que outros jovens na mesma situação socioeconômica, fica claro o quanto a iniciativa favorece não só cada um deles, como também suas famílias e a comunidade onde estão inseridos.
Um importante pilar do Formare é colocar o funcionário como Educador Voluntário, o que o leva a rever suas práticas e interagir com outras áreas com as quais não teria contato no dia a dia do trabalho. Neste sentido, qual o impacto do programa no clima organizacional da empresa?
O Formare é um programa de voluntariado interno importante. Todas as atividades são feitas dentro do horário de trabalho, os funcionários que se voluntariam precisam fazer uma boa gestão do seu tempo, há um desenvolvimento individual que demanda esforço, superação. Muitos vão lá para superar as suas dificuldades de apresentação, de timidez. De todo modo, é voluntário. As pessoas não são convocadas. É iniciativa própria. E também é um voluntariado da gestão. Eu, ao abrir mão de alguém da minha equipe para que participe do Formare, estou concedendo 10%, 20% do tempo daquela pessoa, que será dedicado a atividades que não estão vinculadas à minha área ou aos resultados que eu tenho que entregar. Depende de um exercício de generosidade e de empatia, o que torna nossas equipes mais humanas, com uma perspectiva melhor em relação à diversidade e à inclusão, também ligadas aos nossos objetivos de aspiração.
Outro pilar do Formare é tornar a empresa um ambiente de aprendizagem. Para isso, os educadores voluntários atuam como mediadores no desenvolvimento de competências dos jovens para a vida e para o trabalho. Para você, cuja formação começou exatamente na Educação, qual a relevância disso na formação profissional dos funcionários da Eaton?
Muito embora alguns dos meus voluntários assumam aulas ligadas a áreas diferentes daquela onde atuam na empresa, naturalmente, têm uma prática melhor de planejamento, de organização, técnicas de apresentação, de lidar com a diversidade dos próprios alunos. Só por essa perspectiva, o Formare já é um programa positivo para a organização. Por outro lado, estou na Eaton há 4 anos e sei que o assunto da gestão por competências já vem de longa data na empresa. Isso já perpassa todos os nossos processos de desenvolvimento de pessoas, avaliação de talentos, gestão de desempenho. Não vejo que a introdução dessa metodologia no Formare seja de impacto cultural ou metodológico para nós. Vem para agregar valor. Abre a possibilidade de direcionarmos os nossos potenciais ao programa, de tal forma que possam agregar mais esse viés na trajetória deles, complementando o que a gente já faz.
Muitas empresas parceiras do Formare se referem à vantagem do programa no processo de seleção de novos funcionários, uma vez que, ao final do curso, os alunos que se destacam são efetivados. Isso também ocorre na Eaton?
A grande maioria das pessoas que deixa uma organização em um prazo de até dois anos, é por não se adaptar à sua cultura. E como meu chefe Antônio Galvão sempre diz, “quando estratégia e cultura se colidem, a cultura ganha”. A cultura é a soma de todos os comportamentos, é o jeito que se faz as coisas em uma organização. Você pode ter a melhor estratégia do mundo, mas se as pessoas não a assumem, a cultura vai imperar.
O investimento feito no Formare resulta em menor esforço para recrutamento, porque quando eu converto alunos para os meus quadros operacionais, eles já estão treinados, aculturados, conscientes e engajados com os nossos princípios de gestão. Este é um importante ganho para a Eaton.
Desde a inauguração da primeira turma do Formare na Eaton, em 2009, até o ano de 2018, o programa já formou 820 jovens, transformando a vida deles e de suas famílias. Para isso, contou com apoio de 333 educadores voluntários. De que maneira estes números são percebidos pela Eaton fora do Brasil?
Desde o primeiro ano do Formare na unidade de São José dos Campos, ele é financiado com recursos provindos de uma área denominada Public and Community Affairs, que fica na sede da empresa em Cleveland. Essa área se dedica, entre outras iniciativas, a avaliar e realizar doações voluntárias para as comunidades onde a Eaton tem operações, e não possui em seu histórico um programa mais antigo, nem de tamanho valor do que o Formare. Isso ocorre porque tem sido possível demonstrar, ao longo dos anos, os benefícios que o programa traz, o que viabilizou a adesão de outras plantas: São José, depois Valinhos, Mogi, Caxias e Guaratinguetá. Tal expansão só foi possível porque nós não temos qualquer custo direto. Tudo é coberto pelo fundo.
Como a continuidade do programa é percebida pela Eaton?
Ano a ano, a gente manda um business case, um relatório com todo o histórico do programa, e recebe a notícia de que o financiamento vai continuar porque a empresa entende a relevância disso para o negócio e para as comunidades. Todos os executivos que vêm visitar as nossas plantas querem passar no Formare e conversar com os jovens. Temos essa exposição muito significativa.
Diante do sucesso do programa, a Eaton tem intenção de ampliar o número de unidades no Brasil ou mesmo no exterior?
O Formare tem uma demanda de organização que vai além dos recursos financeiros. Queremos levar o programa para nossa planta em Porto Feliz no próximo ano, o que depende também da estrutura de RH. Em Porto Feliz, após a migração de diversas atividades para um centro de serviços compartilhados, penso que teremos espaço na área para uma boa gestão do programa.